30/12/2009

Das plantas e dos temperos


Origanum vulgare L.

Turismo gastronómico não é coisa que nos seduza: podemos fazer umas centenas de quilómetros para fotografar umas ervinhas na Serra dos Candeeiros, mas não para provar de um prato com elas confeccionado. E, se não viajamos para comer em Portugal, seria de todo inconcebível ir a Londres com esse propósito. Entendamo-nos: cada um tem o paladar moldado pelo país onde nasceu e cresceu, e parece haver uma incompatibilidade radical de gostos culinários entre portugueses e britânicos. É esta a maneira airosa de despachar um assunto embaraçoso, evitando comentar o fish & chips encharcado em vinagre, os legumes ultracozidos sem ponta de tempero, os molhos agressivos que obliteram o sabor da comida (se é que ela tem algum), as versões desenxabidas dos «pratos étnicos». Longe de nós afirmar que tudo isso demonstra uma desafinação grave dos orgãos gustativos dos britânicos. Não, mil vezes não. Acontece simplesmente que tais orgãos foram regulados de modo diferente dos nossos.

Os restaurantes indianos, italianos, gregos, chineses e de não sei quantas mais nacionalidades que proliferam em Londres são a escolha natural do visitante para fugir à comida britânica. Acontece que muitos deles praticam uma cozinha preguiçosa e aculturada. Não têm de fidelizar uma clientela exigente, seja porque ela não existe ou porque o afluxo de turistas incautos é inesgotável. É assim uma verdadeira surpresa encontrar um restaurante como o Da Mario, em Gloucester Road (Kensington), que não cobra preços astronómicos, não é chique nem exige reserva de mesa, e serve comida deliciosa. As pizzas, que há muito desisti de comer nos nossos restaurantes ditos italianos, são aqui autênticos tratados de apuro culinário. O que mais nos atrai ao Da Mario são porém as saladas, em especial a incomparável insalata tricolore: mozarela, tomate, abacate, azeitonas, manjericão fresco, tudo regado com um dourado fio de azeite. Nada mais seria preciso para uma refeição perfeita.

O manjericão ou alfavaca (Ocimum basilicum L.), a que os ingleses chamam basil, é a erva aromática mais usada em cozinha italiana; poucas são as pizzas que a dispensam. Como não tenho à mão uma foto dessa planta, decidi convocar o orégão (Origanum vulgare L.), que casa especialmente bem com o tomate e as azeitonas. Pode assim, numa emergência, substituir o manjericão numa versão caseira da insalata tricolore.

O orégão é um pequeno arbusto compacto (até 30 cm de altura), muito ramificado e aromático, com galhos aveludados, que ocorre naturalmente no norte de Portugal e nos países da bacia mediterrânica. As flores tubulares, de corola penugenta, são brancas ou cor-de-rosa, agrupam-se em cachos cimeiros, e medem cerca de 4 mm cada.

6 comentários :

Gi disse...

Outro dia um inglês explicou-me o conceito de gastronomia deles: a carne, os legumes, são cozinhados separadamente e sem condimentos para manterem o seu sabor específico. Os molhos vêm separados, para cada um juntar conforme a sua preferência.

Tem razão, Paulo, isto não tem nada a ver connosco.

Paulo Araújo disse...

Pois é, Gi, há gente com gostos estranhos. Essa do sabor específico de um alimento que perde todo o sabor ao ser cozinhado parece piada, mas é a sério. Se há coisa que os meus anos em Inglaterra me ensinaram é que ninguém deve viver para comer.

Luz disse...

...E ando eu a comprar oregãos no supermercado e afinal nos matos, junto ao Jardim de infância, há tantas plantinhas destas, que as meninas fazem os seus raminhos com eles. Ainda bem que aqui passei hoje!...
(O meu Pai chamava-lhes ervas das azeitonas... A realidade é que o cheiro é diferente do que se compra e que os meus gatos adoram "os raminhos" que às vezes lhes trago.) Vou experimentar...
Bom Ano Novo
Luz

Luz disse...

Paulo
Não tem à mão uma folha de mangericão, mas eu tenho um vaso na minha cozinha, pois, tal como os Italianos, sou fã do seu sabor. Por isso, se quizer correr o risco de ver uma fotografia bem pior que as suas, eu posso fotografar o meu vasinho, que nesta altura do ano não está no melhor da sua força, mas que ainda vai dando para usar uma folhinhas...
Bom Ano Novo
PS- O meu vasinho claro que é de aviário. Onde há muita alfavaca,que eu não sabia que era Mangericão - A ignorância da Juventude é um espanto!...- é no aqueduto de Elvas, e aí não é usado para a comida... Aí ensinaram-me a fazer um saquinho e a metê-lo na carteira para afastar o mau olhado... Como eu não acredito em mau olhado vou desfazer o saquinho e usar o conteúdo na salada!
Desculpe a brincadeira
Luz

Paulo Araújo disse...

Olá Luz, e obrigado pela oferta, mas não vale a pena ter a maçada. Nunca encontrei manjericão na natureza, e acho batota fotografar uma planta num vaso (embora eu próprio por vezes faça isso).

Se os gatos gostam dos raminhos que lhes traz, então é porque é coisa boa. Nos cães não confiaria tanto, pois já se sabe que são bem menos exigentes.

Feliz ano novo também para si.

bettips disse...

Ah...mas eles têm aquelas delícias dos sirloins, dos T-bones e do rosbife à inglesa, bichos mansos que só podem ser nostálgicos naquelas pastagens verdes - e scones para chá com leite. E "gravy" sempre àparte. Depois, assimilaram há que décadas os hábitos de todos os seus impérios e deambulações fleumáticas; e foi lá, em South Kensington que encontrei - 30 e tal anos atrás - um "bistrô" com ...pura petinga portuguesa como entrada bem como o primeiro caril da minha vida. Quanto aos orégãos ... uso-os em saladas, pizzas, carnes brancas e sempre me vem um doce torpor de Algarve onde são vendidos aos molhos nos mercados que ainda subsistem.
Um Ano Novo cheio de naturezas vivas, vos desejo!
Abçs