Violeta do Teide
O Pico do Teide é um cone vulcânico quase perfeito com cerca de 3720 metros de altura e de formação recente (tem uns 200 mil anos, mas o sistema de vulcões a que ele pertence está ainda activo). No Inverno, e apesar da proximidade das ilhas Canárias ao norte de África, cobre-se de neve; no resto do ano surge em muitas manhãs envolto em nuvens espessas. A paisagem lembra imagens recentes de Marte, com o chão alaranjado, azulado ou esbranquiçado, entremeado por lava escura e cinzas.
Este é um lugar árido e poeirento, com extensas zonas de rocha basáltica sem solo nem água, e diferenças nas temperaturas diurna e nocturna que podem atingir os 20ºC. Por isso, são poucas as plantas que se atrevem a colonizá-lo. Algumas das que o conseguiram, nos declives mais suaves das caldeiras ou em nichos de pedra-pomes, sorvem o orvalho e a neblina fria da noite e são hoje endemismos das ilhas Canárias que ocorrem apenas no Parque Nacional do Teide. A maioria tem folhas lanceoladas e erectas, cobertas de penugem fina onde o orvalho se condensa, com secção em V para que a água que ali caia não se desperdice, sendo canalizada para o centro da planta. A folhagem dispõe-se em roseta, ou num arranjo compacto e prostrado, decerto com o objectivo de minimizar as perdas de água pela excessiva exposição ao sol. Curiosamente, são frequentes as hastes florais altas e ondulantes, que se avistam à distância.
Sob condições tão adversas, as plantas preferem hibernar durante quase todo o ano, florindo brevemente entre Maio e o início de Julho. Nessa altura, a flora do Parque Nacional del Teide é um prodígio de cor e diversidade. Na nossa visita em Maio à Montaña Blanca não havia ainda muitas flores (o que obriga a nova viagem num Junho futuro), mas esta preciosa violeta tricolor estava à nossa espera.
A primeira descrição da violeta-com-folhas-de goivo, que vive acima dos 2100 m e só ocorre no Parque Nacional do Teide, é de Alexander von Humboldt (1769-1859), naturalista e explorador alemão, e do botânico francês Aimé Bonpland (1773-1858). Durante a viagem, financiada por Espanha, que ambos fizeram à América Latina entre 1799 e 1804, registaram mais de 6000 espécies de plantas que eram então desconhecidas na Europa. O navio Pizarro em que seguiam para a América do Sul fez uma escala em Tenerife, a 18 de Junho de 1799, para que Humboldt e Bonplant pudessem subir ao Pico do Teide. A descrição minuciosa da subida, feita no capítulo II do 1º volume da obra Personal narrative of travels to the Equinoctial regions of America, pode ser apreciada com vagar neste endereço. Aí ficamos a saber como os guias tenerifenhos (que, viriam Humboldt e Bonplant a descobrir, nunca tinham antes ascendido ao cume do vulcão) iam sub-repticiamente esvaziando a bagagem onde se recolhiam amostras de rochas e plantas para a subida lhes ser mais leve; e podemos ler uma descrição comentada do que os dois cientistas foram observando, seja sobre a geografia, a meteorologia ou a botânica, seja sobre os vestígios arqueológicos do povo guanche.
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