Arméria dos picos
Ainda que seja considerada rara, a arméria-da-Madeira é uma das espécies endémicas mais fáceis de encontrar na ilha, bastando para tanto visitar o Pico do Areeiro entre os meses de Maio e Junho. De folhas relativamente curtas e largas, e escapos com 20 a 40 cm de altura encimados por capítulos florais de um rosa intenso, é uma arméria que se põe bem a jeito para a foto promocional, escolhendo para seu poleiro os pontos mais elevados da crista montanhosa central da Madeira. Apesar de no continente estarmos de barriga cheia com as mais de 20 espécies de arméria distribuídas de norte a sul tanto no litoral como no interior, seria um erro desdenharmos da espécie madeirense como apenas mais uma para juntar à colecção. Além de detentora de uma elegância imbatível, o cenário vertiginoso onde vive nunca poderá ser igualado pelo relevo manso das montanhas continentais.
E a essas impressões subjectivas junta-se um dado crucial: a Armeria maderensis não é apenas única na sua ilha, é-o também em toda a Macaronésia. O género Armeria está inteiramente ausente dos arquipélagos das Canárias e de Cabo Verde, e é de admitir que também não exista nos Açores. A situação no arquipélago açoriano é dúbia, pois no 2.º volume (de 1984) da Nova Flora de Portugal, e baseando-se em exemplares do herbário do Instituto Superior de Agronomia que teriam sido colhidos em 1954, Franco descreve uma Armeria maritima subsp. azorica que existiria apenas em São Miguel, São Jorge e Flores. Antes de Franco, ninguém havia reportado qualquer Armeria nos Açores; e, desde então, ninguém logrou reencontrá-la no arquipélago. Obras de referência da flora açoriana como o Catálogo das Plantas Vasculares dos Açores (Palhinha, 1966) e a Lista das Plantas Vasculares (Luís Silva et al., 2010) não mencionam qualquer espécie de Armeria. É pois legítimo duvidar que exista (ou alguma vez tenha existido) alguma Armeria espontânea nos Açores.
Que haja apenas uma espécie de Armeria na Madeira também foge à regra. Muitos dos géneros botânicos originários dos continentes (África, Europa ou América) que conseguiram instalar-se nos arquipélagos atlânticos iniciaram depois um processo de irradiação e especiação, evoluindo para distintas espécies separadas geograficamente ou adaptadas a diferentes nichos ecológicos. Exemplos bem conhecidos são os géneros Limonium (da família Plumbaginaceae tal como a Armeria, e que inclui mais de 20 espécies nas Canárias), Argyranthemum, Echium, Sonchus e Aeonium. Mesmo certos géneros endémicos da Madeira (como Musschia e Sinapidendron) contam cada um com três ou mais espécies no arquipélago. Existem armérias nas rochas costeiras de Matosinhos e de Viana, nas bermas das estradas transmontanas, no topo da serra da Estrela, na serra de Monchique, nas praias e falésias do Algarve. O que terá impedido um género ecologicamente tão versátil de se diversificar na Madeira?