Codesso das alturas
Seja na alta montanha ou à beira-mar, os ventos persistentes em zonas desabrigadas têm muitas vezes o efeito de vergarem a espinha às árvores, obrigando-as a adoptar uma postura rastejante; e elas, impedidas de crescer na vertical, resignam-se a fazê-lo na horizontal. No (defunto) pinhal de Leiria, em zonas mais próximas do mar, eram comuns os chamados pinheiros-serpente — e, de facto, as condições para tão estranha forma de crescimento repetem-se em grande parte do litoral português. Se ascendermos às montanhas, há arbutos que só admitem crescer rentes ao solo, formando tapetes de poucos centímetros de espessura. O zimbro-rasteiro (Juniperus communis), que em Portugal se restringe à serra da Estrela (onde é abundante) e à serra do Gerês (onde é escasso), é um exemplo emblemático desse fenómeno.
A planta abaixo retratada, habitante da caldeira de Taburiente na ilha de La Palma, nunca seria exactamente uma árvore — mas, em condições menos agrestes, formaria um arbusto erecto e compostinho, com mais de dois metros de altura. O género de leguminosas a que pertence, Adenocarpus, não costuma destacar-se pela longevidade, talvez por essas plantas serem parte daqueles matos indiferenciados tantas vezes cortados para lenha ou queimados. A ideia de um codesso monumental (tanto em Portugal como em Espanha, codesso é o nome vernáculo dos Adenocarpus) é tão estranha como a de uma giesta ou de um tojo monumentais. No entanto, é forçoso admitir, contemplando-lhe o tronco com quase meio metro de espessura, que este particular codesso de La Palma possa ter muitas dezenas de anos de vida. Não foi a idade que o vergou, mas o vento. E na mesma zona, que é a de maior altitude na ilha, rondando os 2400 metros, vivem muitos outros codessos de idade avançada, todos eles rastejantes por culpa dos ventos. Pelo menos para aqueles arbustos que sobrevivem à fase juvenil, será que o ambiente agreste e o ar rarefeito da montanha é propício à longevidade?
Caracterizados pelas folhas trifoliadas persistentes, pela ramagem profusa e destituída de espinhos, e pelas flores amarelas dispostas em cachos terminais, os arbustos do género Adenocarpus perfazem dez espécies na Peninsula Iberica, seis delas presentes em Portugal. Nas Canárias são três as espécies reportadas, todas endémicas do arquipélago: A. ombriosus (só em El Hierro), A. foliolosus (em todas as ilhas excepto Lanzarote e Fuerteventura) e A. viscosus (apenas em Tenerife e La Palma). A primeira é um arbusto que não ultrapassa 50 ou 60 cm de altura, enquanto que as outras duas atingem envergaduras respeitáveis, podendo o A. foliolosus ascender aos 4 metros. A distinção entre as duas espécies presentes em várias ilhas pode fazer-se pelos cálices (que são densamente pelosos mas sem glândulas no A. foliolosus, e glandulosos com pêlos esparsos no A. viscosus) e pelas vagens (só as do A. viscosus são glandulosas — confirme-se na 3.ª foto acima). Do A. viscosus reconhecem-se duas subespécies, a subespécie nominal apenas em Tenerife e a subsp. spartioides (ilustrada nas fotos) exclusiva de La Palma, justificando-se a segregação pelo comprimento das folhas: são muito mais alongadas as da subespécie palmense (14 mm contra 3-7 mm).