15/08/2005

Às 6 da tarde no largo requalificado

.(Dias sem árvores...)


Espaço requalificado em frente à antiga Cadeia da Relação (edíficio onde funciona o actual Centro Português de Fotografia)

Na sexta-feira passada, cerca das 6 da tarde apeei-me do autocarro no Campo Mártires da Pátria. Contrariamente ao habitual, em vez de me atrasar nos meus recados cumprimentando as minhas amigas do Jardim da Cordoaria, resolvi ir explorar este espaço requalificado, quase completamente deserto, revestido a granito.
Apesar da torreira do sol já ter passado, a esta hora em Agosto o calor ainda se faz sentir e o que irradiava da pedra que reveste o pavimento ainda menos apetecível tornava o largo.
Não pude deixar de me lembrar do que aqui já escreveu o Paulo com a sua habitual verve, em especial da passagem seguinte: «Espaços como estes, por serem hostis à permanência de pessoas, matam o convívio na cidade. Um castigo merecido, ainda assim suave, para quem os planeia, seria obrigá-los a ficar de pé nesses lugares, sem a protecção de uma sombra, durante uma tarde de calor.»

Os autores destes projectos decididamente não calcorreiam a cidade, e muito o menos o fazem de dia! Imaginam estes espaços e as suas intervenções a que chamam "requalificações", de um modo completamente abstracto. De preferência a preto e branco em revistas da especialidade, e de certas escolas. Presumo eu. Se assim não fosse como explicar estas opcções?
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12 comentários :

Anónimo disse...

É mais uma praça "italiana" que além de inóspita também é perigosa. Num S. João de há dois ou três anos atrás ia eu a atravessar a dita praça quando o meu olhar foi atraído por uma cascata plantada na fonte pré-existente que fica na esquina do edifício da Cadeia da Relação. Como ia a olhar para a a cascata, só por milagre não me esborrachei no pavimento em frente à fonte: é que há uma diferença de cota razoável entre a praça e a "pré-existência" sem qualquer elemento arquitectónico que a diferencie. Não há qualquer degrau ou marca no pavimento. Não sei se ainda está assim porque não é lugar para onde vá muito. Mas se assim continuar é normal: estas obras destinam-se a aparecer em revistas, onde ficam muito bem quando fotografadas de determinados ângulos e principalmente a preto e branco. O mesmo se passa com as "cunhas" espalhadas pela Praça Parada Leitão. Já me perguntei várias vezes quantas almas não tropeçarão naqueles monolitos, principalmente à noite, depois de uns copos no Piolho. Existe uma publicação em que colaborei(Registos de uma transformação) onde o Jardim da Cordoaria surge, numa fotografia aérea, como uma espécie de bordado em ziguezague. Como já disse, é para a fotografia. Quanto à publicação que referi, é realmente reveladora do "antes e depois" da Porto 2001.

ManuelaDLRamos disse...

Já aqui publicámos uma fotografia do Jardim da Cordoaria visto do alto da Torre dos Clérigos em que se vêem perfeitamente esses ziguezagues a que se refere.
(Muito obrigada por comentar ;-)

ManuelaDLRamos disse...

É realmente no mínimo muito estranho que dois dos nossos actuais historiadores da cidade se tenham pronunciado negativamente sobre as intervenções no Jardim da Cordoaria e nada tenham dito (se me engano por favor corrijam-me!)sobre o projecto para a Avenida dos Aliados e Praça da Liberdade!

Recordo Helder Pacheco in "Requalificação Urbana" (JN, 28-10-04) «(...) É doloroso e patético ver na Cordoaria os aposentados exercendo o seu direito ao lazer e ao convívio, jogando cartas em posições incríveis, de lado, a três quartos, a cavalo, de pé ou acocorados nos abomináveis bancos de pedra que o pós-modernismo impôs urbi et orbi para suplício dos desgraçados que ainda usam a cidade. Uma vergonha.(...)»
Passagem que já aqui transcrevemos.

E Germano Silva ainda há pouco tempo também se pronunciou de modo veemente: «(...) Com o seu jardim descaracterizado, maltratado, vilipendiado, a Cordoaria, vamos continuar a dizer assim, é, ainda, e sobretudo, uma página da história portuense. Porque a memória não se apaga.(...)» a propósito alías de uma ulmeiro histórico desaparecido há duas dezenas de anos.

Porque será este silêncio (que chega a ser obsceno, perdoem-me o termo)?
Por o arquitecto responsável pela descaracterização da Cordoaria ser de Lisboa e os OUTROS serem cá do Porto? Não, não deve ser isso.
Por "obrigações deontológicas" como também já se justificou alguém. O que é que isso pode significar neste contexto, também não entendo.
Lá diz o povo: "quem cala consente..." mas também diz ..., bem é melhor ficar por aqui...

Ponto Verde disse...

Quando vou ao Porto passo por ali pelo antigoe edificio da Cadeia da Relação, onde Camilo chegou a ser "hospede" , sou visita assídua do Instituto Português de Fotografia, uma obra notável para ser visitada...mas no curto espaço das 15 às 19, assim se fomenta a Cultura em Portugal e se rentabiliza a notável recuperação e requalificação do espaço do qual este campo de futebol em granito (utilização que a "canalhada"- para utilizar o termo de um local- lhe dá, por vezes as bolas ficam presas no gradeamento e é vê-los trepar pela parede) - a praça inóspita que ibriga á fuga rápida deverá estar dentro da não visita ao IPF (?) .Já agora resistam e vão ver a exposição do Alvarez Bravo.

Anónimo disse...

Talvez seja um lugar inóspito, mas se calhar porque o Porto é uma cidade despovoada.
Já se esqueceram do espaço miserável que lá havia antes?
Desse sim, eu tinha vergonha...

Paulo Araújo disse...

Não, não me esqueci do "espaço miserável": tinha árvores, e hoje não há lá nenhuma.

Maria Carvalho disse...

A eira quente que agora, sem jardim nem sombra, ninguém usa mas que todos pagámos e bem, ocupada aos domingos por feira ilegal de passarinhos, é que é uma vergonha.

PR disse...

espere-se por outro Euro. Talvez aí, com o orgulho nacional renovado, a praça se (re)encha de gente para ver as quinas.

Anónimo disse...

vou concordando...
como se sorri ao passar por lá?

como se permanece, se não há porque permanecer?

como se justifica tanto minimalismo?

Anónimo disse...

Efectivamente, uma desolação total. Se fosse eu a mandar, já havia alguma daquela pedra de má qualidade a voar e belas árvores a serem plantadas. Está muito a tempo.
Mas, concordo com o post que diz que o Porto é um deserto. Esta praça é uma metáfora da cidade.
Quanto ao minimalismo, não é o que aqui se vê. No minimalismo, a obra (supostamente de arte) é depurada até às suas componentes essenciais. Onde páram as componente essenciais desta praça? Basta o espaço e o chão e já é uma praça? Isto que aqui ficou não é nada.
Bem vinda de volta :) . -- JRF

ManuelaDLRamos disse...

Obrigada JRF pelas boas vindas mas a minha passagem de volta pela cidade foi rápida e estou de novo longe... desta feita no Sul (Algarve) onde, tradição de família, venho marcar o ponto no Verão. Não sei se vou conseguir enviar alguma coisa para o blogue, a não ser comentários (ou uns postezitos que deixei preparados ;-). Mas hoje já me apeteceu, ao ler uma notícia no Público Local Lisboa sobre um jardim em cuja relva nao se pode andar, onde as bolas não são permitidas. nem crianças de triciclo...

Anónimo disse...

É com grande desgosto que vejo a minha querida cidade, outrora abendonada, ser agora violada por um bando de vândalos com um DR antes do nome. Jardins destruídos, praças de calhau, o eléctrico histórico que tínhamos desprezado, ruas sem qualquer coerência, fachadas de abandono, património entregue ao lixo e à urina, "bancos" de jardim que não permitem descansar as costas, obstáculos arquitetónicos que deveriam merecer um processo em tribunal a quem os planeou e outro a quem os permitiu!!! É tempo de os portuenses que realmente sentem a sua cidade lutarem por ela contra a ditadura da estupidez sofistacada que a tem atacado. Fora o "sizentismo".