07/02/2011

Afinidades vegetais

Dryopteris affinis (Lowe) Fraser-Jenkins


Ninguém se lembraria de desvalorizar os carvalhais alegando que carvalhos há muitos; do mesmo modo, a abundância não retira lustre ao grande feto que protagoniza o episódio de hoje. O Dryopteris affinis, que dá pelo nome vernáculo de fentilha, vive justamente em bosques caducifólios, em locais frescos ou próximos de linhas de água, e notabiliza-se pelas suas frondes arqueadas, de cerca de 1 metro de comprimento, dispostas em forma de volante — não o volante dum automóvel, mas o projéctil usado no badminton. A sua presença em carvalhais e soutos na metade norte do país é indispensável para compor a atmosfera solene e misteriosa desses lugares. Um bosque não é uma plantação de árvores emergindo como postes de um chão nu; há que preencher os intervalos entre os troncos, e entre as copas e o solo, para criar um habitat tridimensional que proporcione refúgio e sustento a animais e plantas. As fentilhas fazem parte desse equilíbrio, ocupando o patamar intermédio entre as copas elevadas e as vidas rastejantes.

As hastes da fentilha (às quais deveríamos mais correctamente chamar ráquis) estão recobertas por escamas castanho-douradas que dão às frondes embrionárias uma aparência de bengala de ricaço. Esse revestimento permite diferenciá-la de uma espécie semelhante, mas menos comum, o feto-macho (Dryopteris filix-mas), que além do mais tem o ápice das pínulas mais arredondado e um menor número de indúsias (membranas que protegem os esporângios) em cada pínula.

Vendo bem, identificar a Dryopteris affinis é tarefa ao alcance de qualquer amador atento. Insatisfeitos com essa democratização da botânica, os profissionais resolveram complicar o assunto a ponto de fazerem dele coutada de especialistas. Assim, a Flora Ibérica assinala nada menos que três subespécies de Dryopteris affinis; e, dentro de uma delas, distingue ainda duas variedades. Alguém muito mais habilitado do que nós escreveu que essas subespécies e variedades «são de difícil distinção, tanto ao nível morfológico, ecológico como corológico». Manda pois a prudência que sigamos o exemplo desse autor, e não nos ponhamos com minúcias taxonómicas despropositadas. Registemos, ainda assim, que em Portugal (e, em particular, na serra do Gerês) estão assinaladas as subespécies affinis e borreri.

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