Flor-de-mel
Cerinthe major L.
Aquilo que é importante, parece-me, não é tanto o defender a cultura, cuja existência nunca impediu um homem de passar fome, mas sim o extrair, daquilo que se chama cultura, ideias cuja força motivadora seja idêntica à da fome.
Antonin Artaud, Le Théâtre et son double (Gallimard, 1938; trad. Liliete Martins)
O género Cerinthe contém cerca de dez espécies que apreciam terrenos rochosos, soalheiros mas pobres da região mediterrânica. Reconhece-se pelas folhas verde-mar, pequenas colheres de margens ciliadas, manchadas de branco, abraçadas ao caule.
É em Abril-Maio que mais apraz encontrá-lo: as flores nascem em cimeiras espiraladas (dizem-se escorpióides) e cada flor tem direito a uma bráctea azulada e a cinco sépalas. O saiote castanho-arroxeado, de cinco pétalas fundidas em sino (contam-se elas pelas dentadinhas no friso recurvado), termina num espartilho amarelo, o pigmento que as abelhas parecem preferir; mas esses tons tendem para o azul com o amadurecer, numa gradação harmoniosa de cores que nenhum designer desdenharia.
Espreitámos o interior da flor, claro, e tivemos de nos contentar com uma expressão que não era para nós, que se destinava a outro tipo de visitante. É a arte do necessário, com uma estética meticulosa para agradar apenas a alguns: rubores e formas acomodam-se a certos gestos do polinizador, num desenrolar indistinguível da vida do artista que a outros é permitido apenas observar.
Cerinthe, do grego kerinos (cera) e anthos (flor), alude à grande quantidade de néctar que esta planta produz, e às nuvens de abelhas que assim logra seduzir. As sementes, de germinação rápida, são nozes escuras em forma de bala.
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