Carqueja
Pterospartum tridentatum (L.) Willk.
A maioria das plantas que, chegando a Primavera, forram de amarelo as nossas serras são leguminosas (família Fabaceae) pertencentes à subfamília Papilionoideae: tojos, giestas, pascoinhas, carqueja. O que unifica esta diversidade botânica, além da afinidade cromática, é o formato característico da flor, com uma pétala superior destacada, chamada estandarte, que exibe um vinco central por vezes bem marcado, e duas pétalas adjacentes a essa (as asas) abraçando as duas pétalas inferiores - as quais, fundidas, formam a quilha.
(Nada como passar da teoria à prática. Se o leitor clicar na etiqueta Fabaceae mais abaixo, encontra muitas flores, nem todas amarelas, que obedecem a esta descrição - trevos, favas, tremoceiros, etc -, mas também encontra algumas que dela divergem. Acontece que as outras subfamílias das leguminosas - Mimosoideae, que inclui as temíveis acácias, e Caesalpinioideae, que engloba, por exemplo, os géneros Ceratonia (alfarrobeira), Caesalpinia e Bauhinia - dão flores de morfologia bem distinta. Tirando a alfarrobeira, essas duas subfamílias não têm, suponho, representantes na flora espontânea portuguesa.)
Embora, visto ao longe, o tapete amarelo da carqueja (Pterospartum tridentatum) se possa confundir com o do tojo (género Ulex), as duas plantas são de facto muito diferentes. A carqueja não tem espinhos, e os seus ramos encontram-se envolvidos por duas membranas verdes e paralelas, que se substituem às folhas na função fotossintética; as folhas propriamente ditas são insignificantes e por vezes estão mesmo ausentes.
Garantem os livros que a carqueja (que é uma espécie essencialmente ibérica, embora haja notícia dela também em Marrocos) é uma planta útil na nossa culinária tradicional: os ramos floridos seriam usados em pratos de arroz e de caça, e as flores secas serviriam para infusões. Isto, suponho, no tempo em que o povo ia à serra e conhecia as plantas. Duvido que em Valongo, onde tirei as fotos, haja muita gente que reconheça a carqueja ou saiba os seus usos. É por isso reconfortante saber que se celebra uma Festa da Carqueja na freguesia da Malcata, no Sabugal. Quando a serra por lá foi florestada com pinheiros, e perdeu uso agrícola e pastoril, as pessoas deixaram de a frequentar. Tempos depois, alguém alvitrou que seria bom, nem que fosse uma só vez em cada ano, por altura da carqueja em flor, regressar à serra para retomar o convívio interrompido. De companheira diária, a serra passou a ser uma amiga distante que se visita de tempos a tempos com grande cerimónia. Mas pelo menos nem ela nem a carqueja ficaram esquecidas.
1 comentário :
Ainda hoje, na Beira Baixa, concelho de Oleiros, há pessoas que colhem a flor de carqueja que, depois seca à sombra, é armazenada em sacos e guardada em locais secos, para ir consumindo na preparação de chá.
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