17/07/2009

Prairie gayfeather


Liatris spicata (L.) Willd.

E eu, que vinha vivendo o visto mas vivando estrelas, e tinha um lápis na algibeira, escrevi também (...). Só, só por causa dos nomes. Sim, que, à parte o sentido prisco, valia o ileso gume do vocábulo pouco visto e menos ainda ouvido, raramente usado, melhor fora se jamais usado. Porque, diante de um gravatá, selva moldada em jarro jônico, dizer-se apenas drimirim ou amormeuzinho é justo; e, ao descobrir, no meio da mata, um angelim que atira para cima cinqüenta metros de tronco e fronde, quem não terá ímpeto de criar um vocativo absurdo e bradá-lo - ó colossalidade! - na direção da altura? E não é sem assim que as palavras têm canto e plumagem.

João Guimarães Rosa, Sagarana (1946)

Alegre pluma da pradaria: é a tradução do nome comum desta herbácea perene norte-americana, e não, caro leitor, a que talvez tenha cruzado a sua mente. Mas tem razão: não é a espiga de flores arroxeadas que se sente jovial ao ver-se linda, de cabeleira rosa-púrpura ao léu, a cavalgar numa crina de verde. Consintamos, porém, estes adornos da linguagem.

Dissequemos a pluma. A haste tem base de folhas alternadas e sésseis, estreitas como as da erva, com cerca de 30cm de comprimento, sendo mais pequenas as mais elevadas no caule. A inflorescência, com cerca de 70cm de altura, raramente múltipla, é feita de capítulos que são discos com 8 a 13 florículos tubulares, dos quais, como é usual na família Asteracea, só alguns são verdadeiras flores (como as do centro amarelo das margaridas) e os outros, que na liatris formam o penacho vistoso de fitinhas sesgas (e constituem as «pétalas» brancas nas margaridas, as que servem ao mal-me-quer-bem-me-quer), são estéreis. Cada flor apoia-se num invólucro de brácteas curvas e pubescentes, e a floração começa no topo da espiga, descendo para níveis onde abelhas e borboletas, enfeitiçadas por aroma sedutor, podem pôr-se de pé a lambuzar-se de néctar.

Aqui temos, pois, um prado de Riobaldos e Diadorins, orgulhosos como convém à espécie, mas sem os disfarces carnavalescos de outros arraiais. E, reconheçamos, é bem urdida a estratégia da liatris para garantir companhia enquanto o tempo, que a amadurece, não a obriga a alegrar-se sozinha.

1 comentário :

Pedro Paulo Bastos disse...

Muito linda a Prairie gayfeather. Aliás, tenho passado a me interessar demais por botânica desde que passei a visitar este blog. Muito interessante! Parabéns.