Azul dos picos
Eryngium bourgatii Gouan
Quando encontrámos a Astrantia, foram as suas indisfarçáveis semelhanças com as umbelíferas fora-do-baralho do género Eryngium que nos deram a primeira pista para a identificação. E em Abiada, na ladeira pedregosa que descia para o ribeiro onde vimos a Astrantia à sombra de avelaneiras, lá estava um Eryngium muito azul para nos avivar a memória, despontando entre as rochas calcárias na companhia de têucrios, orquídeas e cravos. De facto, mesmo os portugueses pouco dados a caminhadas na natureza deverão alguma vez ter visto, quando se preparavam para estender a toalha na areia, o Eryngium maritimum, ou cardo-marítimo, enfeitando profusamente as dunas. Mas este Eryngium cantábrico era robusto, diferente dos que até então observáramos, combinando o azul intenso do E. dilatatum, que conhecemos de Sicó e dos Candeeiros, com o aspecto geral do cardo-corredor (E. campestre), frequente em terrenos baldios e bermas de estrada de norte a sul do país.
Os Eryngium são umbelíferas de índole rebelde, que rejeitam as tradições da família a que pertencem para se mascararem de cardos. A somar a esse transformismo comum a todas as espécies, aquelas que tentam vestir-se de azul, como o Eryngium bourgatii, não o conseguem fazer dos pés à cabeça, e acabam por exibir uma atraente policromia de tons metálicos entre o verde, o prateado e o roxo. São plantas de tão óbvia vocação ornamental que o seu uso em jardins (não em Portugal, claro) tem a força da inevitabilidade.
O E. bourgatii é uma planta quase só ibérica (ou, se quisermos, espanhola), com pequenos contingentes em Marrocos e na vertente francesa dos Pirenéus, que gosta dos ares de montanha e floresce no Verão. Dizem que é indiferente ao pH do solo, mas na Cantábria só a vimos crescer em substratos calcários. Há alguma variabilidade dentro da espécie, pois as plantas do sul de Espanha são menos azuis e têm folhas mais estreitas e espinhentas. A própria Flora Ibérica (o volume correspondente é de 2003), embora não reconheça quaisquer subespécies ou variedades, recomenda que o assunto seja tirado a limpo com recurso a estudos moleculares. Ignoramos se alguém já seguiu a sugestão.
8 comentários :
Ça pique beaucoup!!
Pois pica, mas só os distraídos que lhe passam a mão no lombo. Talvez "Azul com picos" fosse um título melhor.
Tão mas tão bonitos estes azuis bicudos. Por vezes, nas dunas da praia que frequento, surgem assim umas flores a azular, parecidas, talvez. Também lindas e espinhudas.
Boa noite / bom dia a ambos.
Tenho assistido em silêncio de escrita à vossa viagem pelas montanhas 'míticas' das Astúrias.
Não lembro já ter fotografado este nas viagens que por lá fiz; apenas ..talvez um ..parecido (ou será igual?, possível!!!; pelo menos acho que está no Guia da Flora de Gredos) na Serra de Gredos.
E sim, mantenho em casa, desde há 4 anos, um destes azuis (suponho que seja o E. campestre) adquirido numa ida à feira de Barcelos (ou então algum híbrido), e de facto a senhora chamava-lhe simplesmente de azuis. Em todo o caso, seja ele quem for, é um maná para algumas espécies de moscas, de abelhas e de vespas, que antes nunca vira.
Aproveito este meu retiro do silêncio para vos desejar um período de festas a vosso contento.
Abraço.
Carlos
Nas dunas deve ser Eryngium maritimum, também chamado cardo rolador...
Bom dia, Carlos.
O teu Eryngium deve ser um híbrido de jardim, pois o E. campestre não tem ponta de azul. Deduzo que a feira de Barcelos é visita obrigatória para quem goste de ter plantas no jardim (há muita gente que não gosta).
Um óptimo 2016 para ti. Estamos à espera da inauguração da "natureza alargada".
Abraço,
Paulo
Eih pá ..demorei uns segundos, Paulo, e em suspensão, a perceber o da 'natureza alargada'.
Está vazio e estará, penso eu de que..pois logo depois de o abrir, decidi-me pela página do FB - sim, ..rendi-me ..!!! podes dizer..- para tudo o que fui e venho fotografando fora de casa. Portanto ..as coisas estão (muito parcialmente) noutra parte do universo.
Abraço mais uma vez para ambos.
Carlos
NOTA: sim, quase de certeza um híbrido pois tem um azul não muito intenso mas que é ainda azul (e não o marítimo, obviamente); mas tem-me sido fiel, pelo menos o quase único que sobreviveu, com floração todos os anos!!! E embora numa berma da estufa (a descoberto) lá está e estará para o ano.
Continuação das maiores felicidades para este magnífico blogue que sigo, há muito tempo, no meu.
Um abraço
Nazaré Oliveira
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