Mostarda dos taludes
Descurainia preauxiana (Webb) O. E. Schulz
As ilhas são fábricas prodigiosas de diversidade. Vinda do continente mais próximo na forma de semente, instala-se uma planta numa ilha; e, na mesma altura ou uns tempos mais tarde, a mesma planta chega a outras ilhas do mesmo arquipélago. Deixemos as plantas em sossego umas centenas de milhares de anos, sem contacto entre si nem com os antepassados continentais, e no fim observemos os resultados. Não só as plantas se fizeram radicalmente diferentes daquilo que eram à época da migração, como, dependendo da ilha, essa divergência tomou aspectos bem diferenciados. Consideremos, por exemplo, o género Descurainia, integrado na família das couves e das mostardas. Apesar de o género se espalhar pela América do Norte e do Sul, pela Europa e pela Ásia, o seu único representante na Europa (e, de raspão, no norte de África) é a Descurainia sophia, ou erva-de-santa-Sofia, nativa de quase todas as regiões temperadas do hemisfério norte. É portanto de admitir que as espécies de Descurainia existentes nas Canárias — que totalizam sete, tantas quantas as principais ilhas do arquipálago — sejam descendentes dessa única espécie europeia. O arquipélago das Canárias, com uma superfície total que é 1400 vezes menor do que a da Europa, produziu sete vezes mais espécies do género Descurainia — que optaram, todas elas, por ser arbustos perenes, em contraste com a D. sophia e demais espécies do género, que por regra são herbáceas anuais. É de presumir que a amenidade do clima insular, sem grandes variações ao longo do ano, tenha induzido essa maior longevidade: não havendo estações do ano tão adversas que a vida se torne impossível, não se justifica que os organismos abdiquem de viver em certos períodos do ano.
A repartição das espécies de Descurainia entre as ilhas das Canárias é desigual: Tenerife conta com três espécies endémicas (entre elas a D. bourgeana, que vive nos picos do Teide), Grã-Canária com duas, La Palma com outra, e há uma última espécie (primeira em abundância), que é a D. millefolia, partilhada por Tenerife, La Palma e La Gomera. A planta que hoje ilustra o texto é a Descurainia preauxiana, da Grã-Canária, bastante comum na zona central montanhosa da ilha, e com declarada preferência por taludes de estrada convenientemente pedregosos. As folhas pinadas, com lóbulos lineares e dispostas em rosetas nas extremidades dos ramos, permitem uma identificação inequívoca, pelo menos na época de floração da planta — a qual, apesar de certas fontes asseverarem decorrer de Março a Maio, é de facto mais prolongada, como comprovam estas fotos tiradas no final de Dezembro de 2019.
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