Elogio da espera
Toda espera é um pequeno exílio do desejo. A espera supõe paciência, e eis aí um ato exclusivamente humano.
Luiz Antonio de Assis Brasil, Ensaios íntimos e imperfeitos (2008)
É um prado esquinado e florido, rasgado por um carril de caminho de ferro, projecto de Eva Barcala Pérez e José Manuel Mouriño Lorenzo para o Festival de Jardins de Ponte de Lima. As cores fortes mas em plantas minúsculas (como as linárias), e a ausência de movimento, desenham de modo rigoroso uma pausa: um momento consciente de vagar que estranhamos, nós que ocupamos com afã todos os minutos da nossa vida.
Este jardim dá corpo ao conceito de terceira paisagem de Gilles Clément: um espaço indeciso, desprovido de função, ao qual se torna difícil atribuir um nome. Encontra-se em orlas de bosques, ao longo de estradas e rios, nos recantos mais esquecidos da cultura, lá onde as máquinas não conseguem chegar. Tirando partido da falta de decisão humana, as herbáceas nestes domínios crescem desempoeiradas, de malas prontas para o despejo.
Sem querer, esta designação empurra, com alguma aleivosia, este tipo de jardim para o «terceiro mundo». Alusão certeira: para os paisagistas defensores do valor dos jardins que lhes vem dos «equipamentos» e das «instalações», da área construída e não da biodiversidade e sustentabilidade, este é um espaço subdesenvolvido, não capitalista (o 1º mundo) nem socialista industrializado (o 2º). E talvez só desta terceira paisagem se possa genuinamente esperar o não-alinhamento e uma união que transforme o modo de (vi)ver a Terra.
4 comentários :
Que encanto! Um belíssimo recanto não alinhado!
Sim, plenamente de acordo.
Além disso todos os avanços em clonagens e avanços na biotecnologia das plantas (e patentes) "amputou" toda uma filosofia de conservação da natureza e do solo.
Abraços
Estive em Ponte de Lima a ver isto no Domingo... Votei neste.
Sou adepto de jardins com plantas, gosto de jardins com esculturas, mas dispenso a quinquilharia. E pareceu-me ver bastante.
Há umas tentativas para que este tipo de prado substitua o relvado, é bonito e dizem que mais sustentável. JRF
Lembrei o "terceiro-mundista" declive na estação da Trindade... onde não chegou o sizo nem outros constructores-arquitectos-doutores, felizmente!
Abçs
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