Morganheira das Baleares
Quando encontramos uma planta que nunca vimos, podemos ainda assim situá-la numa linhagem de plantas conhecidas se dispusermos de um catálogo (nem que seja mental) suficientemente abrangente. É uma boa ajuda se estivermos num território que, pela proximidade geográfica, se assemelhe a outros que habitualmente frequentamos. Se, de repente, nos víssemos perdidos na Amazónia ou em alguma ilha da Polinésia, de pouco nos valeria o nosso convívio anterior com o reino vegetal, exclusivamente eurocêntrico, não fossem a Madeira e as Canárias terem-lhe acrescentado um cheirinho de África. Estaríamos embrenhados no desconhecido, e o nosso vocabulário para falar de plantas regrediria ao estádio infantil: árvore grande ou pequena, arbusto com ou sem espinhos, flor amarela ou vermelha.
Visitar Maiorca, onde fomos pela primeira vez em Dezembro do ano passado, foi em grande parte uma confortável experiência de reencontro com conhecidas de longa data, à mistura com ingredientes novos para despertar o interesse pela descoberta. Os bosques de azinheiras que cobrem as encostas da serra de Tramuntana são os mais extensos e bem conservados que alguma vez vimos — mas não deixam de ser azinheiras, e sentimo-nos em casa por estarmos rodeados de árvores a que sabemos dar nome. É neste aconchego doméstico que acolhemos novidades como quem muda a decoração do lar: são enfeites novos, mas não muito diferentes dos antigos e adaptados ao mesmo gosto.
Neste jogo de inovar dentro da tradição realça-se o comportamento exemplar das eufórbias. Vimos em Maiorca muita Euphorbia characias, que no nosso país conhecemos bem da Terra Quente transmontana e dos calcários do centro-oeste; por ser Inverno, não estava em flor, mas foi agradável reencontrá-la. Ao lado dela, uma outra elegante eufórbia arbustiva, para nós desconhecida, dava discretamente o toque de diferença; e, ainda que fora de época, insistiu em mostrar-nos algumas das suas flores para que pudéssemos identificá-la. Cumprida com diligência essa tarefa logo que pudemos consultar bibliografia apropriada, concluímos que se tratava da Euphorbia pithyusa. Bastante parecida com a morganheira-das-praias, mas com diferenças nas inflorescências (comparem-se os nectários na quarta foto acima com os desta foto), no porte arbustivo (atinge os 80 cm de altura), no formato mais alongado das folhas e na ecologia, a Euphorbia pithyusa distribui-se pelo Mediterrêneo ocidental: ilhas Baleares (mas não Península Ibérica), Sardenha, Córsega, litoral de França, Argélia e Marrocos. Em Maiorca, onde é relativamente abundante, vive sobretudo em clareiras de bosques no norte da ilha, mas em Menorca prefere o litoral e aí as plantas apresentam um hábito mais rasteiro. O epíteto pithyusa, atribuído por Lineu, dever-se-á a uma algo forçada semelhança com certos pinheiros (pithys em grego), circunstância a que também alude o nome da planta em francês, Euphorbe sapinette.