09/12/2009

Na rota dos três patinhos

Nas loas que aqui tecemos à EN 222, muito gerais e abstractas, não mostrámos as variadas paisagens que se desfrutam entre Vila Nova Gaia e Peso da Régua. Faz-se pois necessária uma adenda, quanto mais não seja como comprovativo de que percorremos realmente esses 130 km de estrada. Mas, antes de comentarmos as imagens, queremos aqui lavrar um protesto. Não muito antes de Castelo de Paiva, uma seta num cruzamento faz-nos abandonar o antigo traçado da EN 222, desviando-nos para uma moderna estrada com separadores centrais e viadutos. Ao longo de uma dezena de quilómetros, esse troço de quase auto-estrada usurpa o título e as funções da velha estrada, que só reencontramos à saída da vila. Ficámos muito desagradados com essa contrafacção de mau gosto.



Quase tanto como as rotundas, os parques de merendas são um dos «melhoramentos» fetichistas mais usados pelos nossos autarcas para ostentarem obra feita. Há, porém, um paradoxo difícil de aceitar: apesar de as rotundas serem tantas vezes trambolhos ofensivos, toda a gente é obrigada a dar-lhes uso; mas os parques de merendas, claramente úteis e de inspiração benfazeja, são em regra ignorados pelos seus potenciais utentes.

Findo o desabafo preambular, diga-se que a foto acima foi tirada do Parque de Lazer e Miradouro da Trincheira, na freguesia de Oliveira do Douro, concelho de Cinfães. Obra estreada há pouco, ainda com cartaz a explicar quem mandou, quem financiou e quem executou, não havia ninguém, apesar da hora propícia, às voltas com farnel nas mesas e bancos de pedra. Do miradouro, tínhamos o rio só para nós. É ali na outra margem, numa encosta com aldeias, campos e arvoredo, que a linha férrea, depois de cruzar o rio Tâmega e o túnel de Marco de Canavezes, encontra finalmente o Douro. Da estação de Mosteirô acabara de sair um comboio para a Régua; ou, como se diz na gíria ferroviária, acabara de partir uma composição procedente de Porto-Campanhã com destino à Régua. Como o Inter-Regional 867 - tal era o seu nome de código - vinha dentro do horário, bem merece o prémio de aparecer na foto.



A vila de Resende ufana-se de ser a capital da cereja, e qualquer português com um mínimo de paladar e de discernimento saberá reconhecer a justeza do título. As cerejas têm a sua época e a deste ano já passou há muito, mas, depois de nos terem deliciado o paladar com os seus frutos, as árvores seduzem-nos a vista com este postal de Outono. E, se juntarmos à lista de atractivos a floração logo à saída do Inverno, são três as razões que as cerejeiras nos oferecem, em três alturas do ano distintas, para visitarmos Resende à boleia da EN 222.



É a derradeira curva do rio antes da Régua. O relevo amenizou-se, as vinhas substituíram as árvores nas encostas, o casario adensa-se. Apesar da queda demográfica de quase cinco mil habitantes nos últimos trinta anos (o concelho tem hoje menos de dezoito mil moradores), Peso da Régua é a cidade mais importante de todo o Douro vinhateiro: cidade utilitária, de negócios, armazéns e entrepostos, que cresceu alimentada pela linha férrea e nunca teve disposição para se embelezar. Hoje, com os prédios desmesurados que sobressaem da malha urbana, e apesar do arranjo menos mau da marginal, é uma urbe decididamente feia. Por isso os turistas preferem fazer paragem no Pinhão e não na Régua, e por isso a cidade está ausente da nossa última foto, tirada à distância de uma curva.

4 comentários :

bettips disse...

Sorriso...
Abçs

ARPires disse...

Não ficam exactamente à beira rio, muito menos com os "pés" na água, mas Lamego e Vila Real são cidades vinhateiras e da "Região Duriense", contrariamente ao que muita gente pensa.
Terras que cresceram sem regras, muitas delas bem feias por sinal, são bem o resultado do nosso atraso cultural que se manifesta sob todas as formas.
Basta olhar para o que se passa nos arredores de Lisboa e Porto e logo temos um retrato do Portugal feio e horrendo que eu "adoro".
Se algum dia pensarmos seriamente em turismo, como o factor principal do nosso desenvolvimento, temos que começar por deitar abaixo muito do que foi construído nos últimos trinta anos.

Menino Tóne: disse...

Boa tarde!

Sou de Castelo de Paiva, pelo que vou comentar a vossa referencia à minha terra natal. Assim, concordo plenamente com as malditas rotundas e os, não poucos, atentados ambientais que por lá vão surgindo como cogumelos! Relativamente à variante à N222,existe ainda a possibilidade de fazer grande parte do itnerário pela "estrada antiga", mais junto ao Douro e bem mais interessante. Bastando para tal saír da variante na Raiva, local onde o itenerário mais recente se desvia do original.Aproveito para vos felicitar pelo blog, com o qual aprendo imenso e sou fã, razões que me levam a visita-lo com bastante frequencia!;o)Cumprimentos, Luís Monteiro

Paulo Araújo disse...

Boa tarde e muito obrigado pelo comentário (que não deixaremos de ter em conta na próxima vez que percorrermos a EN 222).