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01/09/2010

Patinhar em seco

Lythrum portula (L.) D. A. Webb


O que há de mais notável nesta planta glabra e rasteira — habitante de terrenos lamacentos ou de águas baixas e estagnadas — é o contraste entre ela e as suas irmãs. Quem iria adivinhar que a patinha (Lythrum portula), a salgueirinha (L. salicaria) e a erva-sapa (L. junceum) pertencem todas ao mesmo género botânico? Como pode uma ervita prostrada ter algum parentesco com uma planta altaneira e erecta que frequentemente atinge metro e meio de altura? E há ainda a questão das flores: as da L. salicaria são vistosas, de pétalas rosadas; as da L. portula, resguardadas nas axilas das folhas, são minúsculas e, na maioria dos casos, nem pétalas têm (quando as têm, elas são igualmente cor-de-rosa). Algumas medidas ajudam à comparação: as folhas da L. portula têm cerca de 1 cm de comprimento, e as flores, tal como os frutos (visíveis nas fotos), não ultrapassam os 2 mm. A planta é anual, e os seus caules, que costumam enraizar-se nos nós, são muito ramificados, formando um entrelaçado confuso.

O Lythrum portula tem uma ampla distribuição europeia, e só está ausente da Islândia. Em Portugal, e apesar do optimismo de alguns, não é assim tão fácil encontrá-la. Na área do Parque Nacional da Peneda-Gerês, contudo, é uma presença comum em terrenos turfosos nos arredores de Pitões das Júnias; e também é possível vê-la na Área Protegida das Lagoas, em Ponte de Lima.

21/09/2009

Caçador de rios 3: Roding


The Temple - Wanstead Park - Epping Forest

Londres de A a Z é um atlas de ruas em formato de livro que se folheia como se fosse romance, com a peculiaridade de sermos nós os protagonistas. Abrimos a página com o quadradinho onde nos encontramos e espetamos o dedo: estamos aqui. Tal é a minúcia do atlas que nem os caminhos florestais foram esquecidos: podemo-nos guiar por ele na Epping Forest, mas só na metade sul, que o resto já fica de fora. Foi assim que consegui ir a pé da estação de Leytonstone até ao parque de Wanstead, parte da floresta que pertenceu a uma casa senhorial demolida em 1824. Regista a história terem aqui existido grandiosos jardins formais, com longas alamedas e parterres graciosamente geométricos. Hoje nada disso sobra, engolido que foi pelo arvoredo espontâneo. Dessa época ficaram apenas o templo - pequeno edifício com pórtico neoclássico, onde funciona o atendimento aos visitantes - e os lagos artificiais com ilhotas arborizadas, alguns deles quase secos por altura da minha visita, em meados de Agosto.


Lago com Lythrum salicaria - Wanstead Park - Epping Forest

O rio Roding, afluente do Tamisa, tem aqui um troço que corre paralelamente a um lago de formato longilíneo, cuja vocação claramente fluvial talvez tenha sido despertada pela vizinhança do seu colega nas lides aquáticas. Vistos do caminho que os separa, lago e rio parecem gémeos. Mas eu, instruído pelo meu A a Z, queria por força atravessar o rio; e um lago, por muito que se disfarce de rio, não precisa de ser atravessado, mas tão só circundado. O rio marca aqui os limites da Epping Forest; logo depois há uma estrada servida por um autocarro que me transportaria comodamente até à parte da floresta mais a norte. Para chegar à paragem só teria de transpor o rio - proeza trivial, bastou descalçar os sapatos e arregaçar as calças - e rodear as traseiras do bairro contíguo à estrada.


Rio Roding - Epping Forest, Londres (em primeiro plano, Acer pseudoplatanus)

A Grã-Bretanha é talvez o país mais liberal (ou será socialista?) do mundo a conceder direito público de passagem em propriedades privadas: por toda a ilha existem trilhos, muito usados por caminheiros e amantes da natureza, que nenhum proprietário tem permissão para vedar. O reverso da medalha é que, onde não houver caminho autorizado, a passagem é mesmo impossível e não há desenrascanço que nos valha. Ou, se não for impossível, é arriscada e imprudente. E o A a Z, vendo bem, não indicava qualquer caminho legítimo até à estrada, mesmo estando ela ali tão perto.

Ocorreu-me isto depois de ter saltado duas vedações e de me ter visto a salvo, ainda atarantado de susto e com arranhões nas mãos e nos joelhos, na paragem que me propusera alcançar. A primeira barreira era inocente, quase convidativa: uma paliçada de madeira baixa, dando acesso a um carreiro que parecia desembocar na estrada. Mas a segunda barreira, depois de duas centenas de metros rompendo por uma vegetação cada vez mais densa e espinhenta, era gratuita e maldosa, formada por barras metálicas com dois metros de altura e pontas aguçadas. Recuar estava fora de causa, mas não sei como consegui ultrapassar tamanho obstáculo com a roupa intacta. Não invadi propriedade alheia e, tanto quanto sei, ninguém me observou neste exercício de alpinismo à mão desarmada. Mas não quero repetir a aventura: doravante, ficar-me-ei pelos caminhos assinalados no mapa.

02/07/2007

Erva-carapau

Lythrum salicaria - Quinta de Sto. Inácio

Irmã da erva-sapa

18/06/2007

Erva-sapa


Lythrum junceum - Parque da Cidade, Porto

Identificámos esta espécie com a ajuda do guia de campo Flora of the Azores de Hanno Schafer (Margraf Publishers, 2005). As flores são solitárias e dispõem-se nas axilas das folhas sésseis, parecendo subir graciosamente por um caule erecto que não ultrapassa os 40cm de altura.

A erva-sapa é nativa do sul da Europa e norte de África e é irmã da erva-carapau, a Lythrum salicaria, comum nos nossos bosques húmidos e uma praga séria em campos do oeste americano. Ambas se servem de uma estratégia sofisticada para encorajar a polinização cruzada: têm flores de tipos distintos relativamente ao tamanho dos estames (que são 12, 6 curtos ou médios e 6 longos) e do pólen; com esta diferenciação, cada pólen fertiliza melhor uma planta diferente da que o produziu.

Na mesma família estão as famosas lagerstroemias e romazeiras.

13/10/2006

Fogo eterno

Conta a lenda que Prometeu, deus grego guardião do fogo, o terá roubado a Zeus - que amuado connosco o escondera - para o doar aos não divinos. Ousadia devidamente castigada com o envio imediato de Pandora, que não hesitou em abrir entre nós a inesgotável caixa de reveses e infortúnios. A Cuphea ignea, herbácea de floração abundante, que floresce todo o ano e cujas flores lembram cigarros acesos, pode bem servir como lembrança da dádiva fértil de Prometeu.


Cuphea ignea

De origem mexicana, tem flores solitárias, axilares, sem pétalas, com um cálice tubular vermelho-alaranjado que termina num anel cinza - e parece um graveto de ponta incandescente. Quando destacada e invertida, cada flor assemelha-se à figura de um santo de túnica, dai a designação comum santantoninho.

Da família Lythraceae, que inclui as romãzeiras e as lagerstroemias, o género Cuphea abriga cerca de 260 espécies da América tropical. Em zonas onde as palmeiras do dendê (a africana Elaeis guineensis ou a americana E. oleifera) não se dão bem, tem crescido o interesse pelo óleo de sementes de cúfea, usado em sabonetes, detergentes e rebuçados.

Alguns recantos do Jardim do Carregal estão forrados com C. gracilis, planta brasileira de discretas flores lilases ou brancas que, como velhotas gaiatas, mudam para cor-de-rosa com a idade.


Cuphea gracilis

13/07/2005

Lagerestroémias dos Jardins da Casa de Mateus

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Lagerstroemia spp. em flor - Casa de Mateus, Vila Real -Setembro 2003

A propósito de uma conversa que se vai desenrolando aqui, lembrei-me destes lindíssimos exemplares de lagerestroémias dos jardins da Casa de Mateus. Assim estavam esplendorosas ao sol nos canteiros bordados a buxo, sobre o fundo da notável sebe-túnel de Cupressus lusitanica.
No Porto já começaram a florir e assim se manterão até ao Outono.

Estas pequenas árvores têm qualidades ornamentais durante todo o ano e não apenas na época da floração de Julho a Setembro. No Inverno são particularmente interessantes a silhueta de ramos tortuosos, e as cores matizadas do tronco de superfície lisa, manchado de castanho, cinzento, rosa e cor de canela, devido a uma casca que, à semelhança do plátano, se fragmenta em placas.

Originária da China, já era cultivada na Coreia e na Índia antes de chegar à Europa em meados do século XVIII, graças ao botânico e coleccionador de plantas, o sueco M. Von Lagerström (1696-1759), Director da Companhia sueca das Índias orientais. Lineu ao baptizar o género de Lagerstroemiae homenageou este seu amigo que lhe enviava exemplares da flora da Índia. Daí a designação "indica" da espécie cultivada em Portugal para fins ornamentais, a Lagerstroemia indica, apesar de ser realmente proveniente da China.

Segundo um amigo (eng. silvicultor) que inquiri sobre o nome vulgar quando tirei estas fotografias há dois anos, em alguns catálogos a espécie aparece referida como "lagerestroémia", com o "aportuguesamento" do nome genérico latino (um processo aliás comum para designar espécies exóticas para as quais o nome vulgar não é ...vulgar), mas em certas publicações de divulgação vem referida como "flor-de-merenda" e "suspiros".
Num livro entretanto publicado, Portugal Botânico de A a Z (de Luís Mendonça de Carvalho & Francisca Fernandes), para além destas, aparece também a designação de "extremosa" e para a L. speciosa, "lagerestrémia", mas não "árvore-de-Júpiter" que parece ser uma denominação também corrente como o demonstra o facto de se encontrar em placas identificativas dos jardins (pelo menos em Guimarães -como nos lembrou MA , e em Leiria).

Outros nomes: à Lagerstroemia indica chamam os franceses "lilas des Indes" (nome por que também é conhecida nesse país a Melia azederach...), para além de "lilas d'été", "lagerose" e "fleur de mousseline". Esta última designação deve-se à forma ondulada das pétalas. O nome inglês de "crape myrtle" deriva não só deste aspecto frisado das inflorescências mas também do facto das folhas, de algum modo, se assemelharem às da murta.

07/01/2005

Os nomes das árvores - Romãzeira

.A romãzeira ou romeira (Punica granatum L.) é uma pequena árvore de tendência arbustiva com uma enorme resistência a condições de seca, apreciada tanto pelas flores como pelos frutos. Estes adornam tradicionalmente as nossas mesas nesta altura do ano com a sua coroa perfeita e interior deslumbrante. Associadas a votos de ano afortunado, em certas famílias há ainda o costume de, no dia dos Reis, partilhar romãs para que durante o resto do ano não falte sorte nem dinheiro. "Bagalhos" e "bagulhos" são aliás designações regionais e populares para os "bagos" da romã e para o dinheiro.

Quase toda a simbologia popular e erudita associada à romã - abundância, fertilidade, união - está relacionada com a opulência das suas sementes. Característica morfológica que também determina a designação da romãzeira na maior parte das línguas europeias e está patente no seu nome científico, Punica granatum, em que o último termo, designativo da espécie, significa "abundante em grãos".

Em português, sinónimos de romã, temos os regionalismos "milgrada, milgrã e milgranada", «de mil grãos ou mil sementes, onde mil significa número indefinido» como explica o grande etnólogo e filólogo José Leite de Vasconcelos. Igualmente se encontra o étimo latino relativo a "grãos", no granada espanhol e no grenade francês, verificando-se para além disso, a presença de elementos que significam "maçã", "pomo", por exemplo em inglês, pomegranate, alemão, granatapfel e italiano, melograne.
Neste último, transparece uma das denominações usadas pelo romanos para a romãzeira, malum granatum, em que "malum" (do gr. melon; dórico mâlon) é um termo genérico que muitas vezes serve para referir tudo o que se assemelhe a maçãs.

Plínio, o grande naturalista romano do séc. I da nossa era, denominou-a malum punicum. Esta última palavra deriva de "poeni" (do gr. phoenikes) nome que os romanos davam aos habitantes da cidade fundada pelos fenícios no séc. IX a.C. no Norte de África, e exprime a ideia "de Cartago"; pode também significar "vermelho, da cor da púrpura", a famosa púrpura de Tiro (substância corante proveniente de uma glândula de um gastrópode marinho do género Murex) que os fenícios comercializaram.
Punica granatum, o nome científico instituído por Lineu, baseou-se aparentemente nas duas denominações criadas pelos romanos, e mesmo sem ser deliberadamente, presta homenagem aos fenícios pois terão sido estes a introduzir a romã no ocidente trazendo-a da Ásia Menor onde há muito era apreciada.

O género Punica compreende apenas duas espécies: a P. protopunica que só se encontra na ilha de Socotorá (Iémen) e a P. granatum de que estamos a falar. Esta, oriunda de uma zona que se estende do sul do Cáucaso ao norte da Índia passando pelo Irão (antiga Pérsia), é um dos frutos de que se conhecem testemunhos mais antigos. Aparece, por exemplo, representada no túmulo do faraó Ramsés IV (séc. XII a.C.) e, é interessante notar, dada a sua importância na simbologia do judaismo, que a única relíquia recuperada do chamado primeiro templo de Jerusalem é uma pequena romã em marfim do séc. VI a.C.. Em hebraico diz-se "rimon", e "ruman" é o termo árabe equivalente de onde parece derivar o nosso romã. (o nome da romã noutros idiomas)
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