15/07/2009

Da Califórnia para o charco


Pinus radiata D. Don; à direita dois Cedrus deodara (Roxb.) G. Don

Imaginem uma Carmen de Miranda com uma vida às avessas: de Hollywood para o Marco de Canavezes. Pois é essa, sem tirar nem pôr, a biografia deste pinheiro: originário das alegres plagas por onde surfaram os Beach Boys, rumou à cauda da Europa e aí se radicou numa ilhota artificial rodeada por um charco (José Carlos Loureiro dixit). Que o charco vá ser convertido em espelho talvez conforte o machucado amor-próprio de estrela-que-não-chegou-a-brilhar, apanhada que foi em contramão pela vida; mas esse tributo à vaidade envolve uma operação do mais alto risco. Só se sobreviver a ela é que o pinheiro poderá mirar-se em águas finalmente límpidas, desacompanhadas pelo quá quá irritante dos patos. A vida em troca do espelho: valerá a pena?

[Este Pinus radiata, ou pinheiro-de-Monterey, é uma das dezassete árvores ameaçadas pelos edifícios anexos que, a pretexto da conversão do Pavilhão Rosa Mota em centro de congressos, irão ocupar a esplanada e reduzir o lago a menos de metade. E, à cota da entrada principal do pavilhão, há outras treze árvores garantidamente para abater. São trinta as árvores em risco de se perderem com esta requalificação, apesar de o arquitecto ter asseverado que nenhuma iria abaixo. Sobre este assunto a associação Campo Aberto emitiu um comunicado que pode ser lido aqui.]


Pinus radiata: tronco, ramagens e folhas

Embora os pinheiros sejam das árvores mais fáceis de reconhecer, a tarefa de distinguir as diferentes espécies pode ser problemática. Não precisamos de grande erudição botânica para identificar o pinheiro-bravo (Pinus pinaster) e o pinheiro-manso (P. pinea), muito abundantes no nosso país, mas a coisa complica-se quando deparamos com algum pinheiro que escapa ao figurino habitual. É que existem mais de cem espécies de Pinus; mas, felizmente para quem procura identificá-las, só cerca de dez são cultivadas por cá.

As folhas do pinheiro, compridas e finas, popularmente chamadas agulhas, são a chave mais segura para a identificação: organizando-se em molhos de duas a cinco, variam em comprimento, espessura e grau de flexibilidade. Tanto no pinheiro-manso como no pinheiro-bravo, por exemplo, as agulhas vêm aos pares e atingem os 20 cm de comprimento, mas as do segundo são mais espessas e rígidas. No caso do pinheiro-de-Monterey, as agulhas estão dispostas em trios, são finas e flexíveis, e não ultrapassam os 15 cm (as que pudemos medir andavam pelos 12); além disso, aglomeram-se na ponta dos galhos em conjuntos que fazem lembrar piaçabas (foto acima). Também característico deste pinheiro é o ritidoma profundamente sulcado, de um tom entre o cinzento e o castanho.

O Pinus radiata é originário de uma pequena faixa costeira na Califórnia. Apesar de as populações naturais da espécie estarem ameaçadas, é um pinheiro muito cultivado em regiões temperadas para produção de madeira e de resina. Na Nova Zelândia e na Austrália, por exemplo, ele forma extensíssimas monoculturas, e mesmo em Portugal surge nalgumas plantações florestais do norte e centro. De crescimento rápido, aos quarenta anos atingiu já a plena maturidade. O seu valor ornamental é sobejamente comprovado pelo exemplar cinquentenário no Palácio de Cristal, um dos raros que conhecemos em jardins portugueses.

3 comentários :

Nenúfar Cor-de-Rosa disse...

Fantástico blogue :-))!

Ricardo S. Coelho disse...

Deixei já uma ligação para este post no blogue do Movimento em Defesa dos Jardins do Palácio:
http://defesadopalacio.pegada.net/
Unidos, conseguiremos deter mais este atentado.

Paulo Araújo disse...

Publiquei um texto a anunciar o lançamento do manifesto e da página do movimento. Também pus a ligação para essa página em destaque na coluna da esquerda. Oxalá a contestação seja bem sucedida e a Câmara seja obrigada a recuar.