21/07/2011

Arroz malandro



Sedum maireanum Sennen

As plantas do género Sedum apreciam reentrâncias de seixos, fazendo-nos saber que, ao contrário do que parece, há sumo no farelo da pedra. Os muros das cidades, quando em ruínas e sem grafitos, são um sucedâneo deste habitat que alguns arrozes-dos-telhados reciclam. Mas não todos. Este endemismo de Marrocos e da Península Ibérica é uma planta anual que precisa do ar enevoado das alvoradas e anoiteceres na montanha, embora também se possa encontrar em prados turfosos a baixa altitude e em areias temporariamente encharcadas. Dado o nosso arreigado hábito de maltratar as zonas húmidas, tornou-se raro por cá, embora haja registo dele em meia dúzia de províncias. A recompensa de uma tarde inteira de procura na serra do Açor foi uma única população pequena à beira de um riacho.

Quando em flor, na Primavera ou Verão, é das crassuláceas mais bonitas: as folhas alternas, lineares, de secção redonda, são amiúde de cor afogueada; e as flores, dispostas em corimbos, têm pétalas apiculadas cor-de-rosa, soldadas na base para formar um tubo curto - um arranjo delicado onde se destacam os dez estames dispostos em estrela e as anteras vermelhas. Como os outros, este Sedum mostra sinais de adaptação a condições extremas. As folhas são suculentas e pequenas (c. 8 mm), para não perder demasiada água por evaporação, os talos são rasteiros (de uns 10 cm), para se abrigar do vento, e os sistemas radiculares parecem exímios a procurar água e nutrientes. Além disso, antes da seca e dos incêndios do Verão, desaparece.

O nome presta homenagem ao botânico francês René Charles Joseph Ernest Maire (1878-1949), professor de botânica na Argélia, explorador da flora do Saara central e autor dos dezasseis volumes da Flore de l'Afrique du Nord (edição póstuma em 1953). Dezasseis? Certamente não descreve apenas o deserto, quase só dunas e siroco, uns poucos oásis e não mais de quinhentas espécies de vegetação de savana semi-árida, uma amostra botânica insignificante face à extensão daquele território. Porém, no canto noroeste de África, perto da ponta sul de Espanha, com um olho no mar Mediterrâneo e outro no oceano Atlântico, há a Cordilheira do Atlas, neve, floresta e uma biodiversidade invejável, e, mais acima, parte da Cordilheira Bética. Segundo as referências, foi em Marrocos, não muito longe de Casablanca, no sistema montanhoso Rif, onde chove a cântaros em boa parte do ano, que este Sedum foi primeiro encontrado por L. Emberger e R. Maire, em 1927. Chamaram-lhe S. villosum var. aristatum (Pl. Rif. Nov. 1: 7). A nomenclatura em vigor, contudo, é devida a Sennen (Étienne Marcelin Granié, 1861-1937; Diagnoses des Nouveautes Parues dans les Exsiccata Plantes D'Espagne et du Maroc 190, 1936) e a Mauricio (Desiderio Arnaiz), que o descreveram, em 1933, no Catálogo de la flora del Rif Oriental.

3 comentários :

ZG disse...

Bela planta e excelente post!!

Gi disse...

As anteras são uma graça :-)

Maria Carvalho disse...

Parece-me um caso de especialização notável: a natureza a servir-se de duas cores. Como nós, nos semáforos. O vermelho avisa o polinizador que não avance - ainda é cedo porque o pólen não está pronto - e afasta os predadores que poderiam destruir a antera; o amarelo que, dizem, é a cor que atrai os insectos, dá finalmente o sinal de que o caminho está franqueado.