16/07/2010

Amoras bravas

Rubus vigoi Roselló, Peris & Stübing
Há dois modos de encarar os silvados (género Rubus): como empecilhos que tornam intransitáveis os trilhos florestais, ou como fornecedores dos deliciosos frutos silvestres que se podem consumir in loco ou convertidos em compota. As amoras silvestres são de facto, para o paladar de muita gente, muito mais apetitosas do que as amoras legítimas das árvores a que chamamos amoreiras (género Morus). E vem a propósito assinalar que a semelhança dos frutos das silvas com os das amoreiras é puramente fortuita, já que os géneros botânicos Rubus e Morus são evolutivamente muito distantes entre si.

Há silvas que dão frutos tão especiais que nem mesmo o risco de o pomar se transformar numa selva consegue dissuadir o seu cultivo. O caso emblemático é a framboesa, que é produzida pela Rubus idaeus (não há como disfarçar: Rubus significa silva) e na verdade não passa de uma amora com a mania das grandezas.

Além de poderem ser cultivadas — ou pelo menos toleradas — pelos seus frutos, as silvas também podem cumprir um óbvio papel na formação de sebes invioláveis. O que já não ocorrerá a muita gente é valorizá-las pela beleza. Mesmo os botânicos que as estudam fá-lo-ão pela motivação científica e não por se encantarem com elas. É que, entre os géneros de plantas vasculares, o Rubus constitui, segundo consenso dos estudiosos, o mais complexo e enredado de todos. Abundam as variações, os híbridos e até as micro-espécies — plantas de existência muito localizada e que, reproduzindo-se vegetativamente, adquirem caracteres morfológicos estáveis.

Há porém algumas silvas que são de reconhecimento fácil. A mais comum — e talvez a de frutos mais saborosos — é a Rubus ulmifolius, que dá pequenas flores com pétalas rosadas. A Rubus vigoi, que hoje aqui trazemos, e que encontrámos no trilho dos Carris, no Gerês, aparece ocasionalmente nas orlas florestais do norte do país. Distingue-se de outras silvas de flor branca (como a Rubus caesius) pelo maior tamanho das suas flores — que são bonitas, quase comparáveis a rosas, lembrando-nos que rosas e silvas pertencem afinal à mesma família botânica.

Quanto aos frutos, não sabemos se são proporcionalmente grandes ou se teremos ocasião de os provar. Certo é que, com os calores de Julho, começam a negrejar as amoras nos silvados. Não importa que nos vedem o caminho se tiverem a amabilidade de nos refrescar.

2 comentários :

Luz disse...

São selvagens (ou bravas, na minha terra), mas são deliciosas,e tal como diz ao natural ou em compota. Quando eu era pequena ainda tinham outra função, serviam de baton quando brincávamos aos cabeleireiros...
Também costumavamos apanhá-las aos quilos para fazer a compota que devia durar durante o inverno, e que sabia sempre a sol e a verão. Agora já apanho menos mas ainda faço um ou dois frasquitos por ano. Mas o gosto agora é bem melhor. Sabe a infância!

Anónimo disse...

Falta ainda referir um outro uso para as amoras bravas.
Quando eu era menino o vinho dos pequenos agricultores era vendido aos armazenistas da região com preço determinado pela graduação alcoólica e pela densidade da cor. A razão é óbvia : quanto maiores aqueles valores maior quantidade de água podiam adicionar ao vinho.
Quantas vezes eu fui mandado apanhar amoras(de silva) para adicionar ao mosto antes da fermentação!
Duarte Marques