14/07/2010

Alcar do Gerês


Tuberaria globulariifolia (Lam.) Willk. [sinónimo: Xolantha globulariifolia (Lam.) Gallego, Muñoz Garm. & C. Navarro]

Há plantas que têm um modo especial de adormecer: não desaparecem aconchegadas no solo, mas deixam à superfície uma roseta de folhas como promessa e desafio; desafio dirigido aos botânicos amadores para adivinharem o que elas prometem dar. O alcar-do-Gerês acenou-nos ainda no frio de Dezembro, quase no início do longo trilho que segue o rio Homem até aos Carris. Eram folhas como nunca tínhamos visto: pecíolos longos, faces lustrosas sulcadas por três veios longitudinais, uma curta penugem sublinhando as margens. Uma estampa com desenhos de plantas do Gerês num livro de Oleg Polunin desvendou-nos a identidade da planta, e marcou-nos o regresso ao local para fim de Maio.

A família Cistaceae, a que pertence esta planta (e que inclui as estevas e os sargaços), é como os bons restaurantes: só serve produtos frescos, e rejeita em absoluto os pratos requentados. Os polinizadores que se regalam no néctar nem precisam de perguntar, já sabem que a flor é fresquinha, acabada de abrir. Pelo final da tarde, todas as flores - mesmo as que não foram usadas - largarão as pétalas à hora de fechar o estaminé. Ficam as plantas rodeadas por tapetes coloridos muito mais bonitos do que os sacos plásticos onde os restaurantes despejam as suas sobras. Mas ainda assim é bem mais gratificante encontrar as flores na planta do que vê-las desfeitas no chão.

Talvez essa alta rotatividade floral e o longo período em que ela decorre (de Maio a Setembro) não permitam ao alcar-do-Gerês exibir de cada vez muitas flores abertas. O máximo que encontrámos foi três ou quatro por planta. Cada flor amarela tem uns cinco centímetros de diâmetro e um anel acastanhado no centro; é uma versão em ponto grande da flor da tuberária-mosqueada.

A Tuberaria globulariifolia é um exclusivo do noroeste da Península Ibérica; em Portugal, ocorre no Minho, no Douro Litoral e nas Beiras, mas só no Gerês parece ser fácil de encontrar. No barrocal algarvio existe uma planta tão semelhante a esta que até já foi considerada uma subespécie: trata-se do alcar-do-Algarve, ou Tuberaria majus. Fica o leitor convidado a descobrir as diferenças.

3 comentários :

Ana Carvalho disse...

Parabéns pelo blogue! estou a conhecer aos poucos... tanta coisa!! a forma como escreve dá vontade de ler mais e mais. Obrigada! estou a aprender muito. Bom trabalho
Beijinhos

Rosa disse...

Eu tenho esta lá num cantinho do jardim.
http://cheirar.blogspot.com/2007/05/alcar.html
Será que está correctamente identificada?

Paulo Araújo disse...

Sim, Rosa, suponho que está com o nome certo. A T. globulariifolia, a T. majus e a T. lignosa são três plantas muito parecidas - mas a terceira é a «menos parecida», por lhe faltar a mancha castanha no centro da flor. Outra diferença é a distribuição: a primeira só existe no Norte, a segunda restringe-se ao Algarve, e só a terceira é que está mais espalhada. Mas esta galeria de fotos pode dar jeito para confirmar a identificação. É de prestar especial atenção às folhas basais, já que a forma da flor pode variar um pouco.