23/04/2010

Curar as feridas

Anthyllis vulneraria L. / Briza maxima L.
Os ervanários tradicionais vendiam em saquinhos (e talvez ainda vendam) uns preparados que eram uma mistura de folhas e galhos secos. Ainda que de efeito ténue ou mesmo indetectável, essas mistelas compensavam a debilidade terapêutica com a versatilidade das suas aplicações. Tanto podiam ser empregues em tisanas (uso interno) como esfregadas directamente na cútis do paciente (uso externo). Os dois modos de usar podiam ainda, com assinalável poupança de esforço, ser combinados num só: a mesma infusão em água quente tanto podia beber-se como ser aplicada directamente à pele. O chá não seria delicioso, mas não causava indisposições nem azias; e, se não curava as doenças de pele, esse banho aromatizado também não parecia provocá-las.

Vem isto a propósito da leguminosa que aqui trazemos hoje e que é tradicionalmente conhecida como vulnerária, nome que aliás coincide com o seu epíteto científico. (A gramínea que também se vê na foto tem o sugestivo nome de bole-bole.) Vulneraria significa, em latim, a que cura as feridas. Aquele a que hoje chamaríamos cirurgião, ou homem cuja profissão é tratar os feridos, era chamado vulnerarius em latim. Vulnero significa ferir, e vulnus é ferida. O étimo sobrevive em português no adjectivo vulnerável.

Não espanta pois saber que a vulnerária, fresca ou seca, era usada em cortes, contusões e queimaduras, servindo para estancar hemorragias e acelerar a cicatrização das feridas. Possui assim todas as qualidades para integrar o mix multiusos que os ervanários disponibilizam aos seus clientes. Quanto a poder ser ou não ingerida, a opinião dos herbívoros que ruminam nos nossos campos é francamente positiva.

A vulnerária é uma herbácea de vida curta, peluda, de 20 a 60 cm de altura. Distingue-se pelas brácteas verdes, lobadas, que servem de colarinho às inflorescências. Reconhecem-se dezenas de subespécies da Anthyllis vulneraria, mas não é fácil destrinçá-las. No livro Plantas a proteger no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, António Flor refere a ocorrência no PNSAC de uma Anthyllis lusitanica Cullen & P. Silva, mas deve tratar-se da mesma a que a Flora Digital de Portugal chama Anthyllis vulneraria subsp. gandogeri (Sagorski) W. Becker ex Maire.

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