06/03/2010

Homenzinhos com barrete

Orchis conica Willd.
A maioria das orquídeas europeias usa um esquema fascinante, mas arriscado, de polinização. Baseado no logro e na audácia dos sedutores, tem de garantir que os polinizadores — que pouco ou nada recebem em troca do serviço — não desistem. A estratégia tem o guião seguinte.

1.º A arte de enganar

As orquídeas atraem os polinizadores oferecendo alguma substância nutritiva, enganando-o, aprisionando-o (sem o matar, como as do género Cypripedium) ou permitindo-lhe que se abrigue num capuz durante a noite ou do mau tempo (como as do género Serapias).

As flores parecem ser das que dão néctar (grosso modo, as orquídeas assemelham-se a liliáceas, com um labelo onde os insectos aterram; em algumas, eles são depois guiados por penugem ou pintinhas, como luzes de uma pista de aeroporto, para um cálice ou corola tubular onde esperam encontrar néctar). Além disso, para que os insectos não hesitem, as orquídeas florescem antes das plantas que tentam imitar. Mas o néctar encoraja os insectos a permanecer na mesma inflorescência, impedindo a variação e outras vantagens da polinização cruzada. Pesando na balança o risco de, sem néctar, terem uma taxa reduzida de clientes, as orquídeas em vez de se cansarem a cozinhar petiscos para as visitas, acenam com algo que, sabem, os insectos não recusarão: sexo.

Os sinais de artimanha são variados. Emitem um perfume semelhante ao das feromonas que excitam os machos, à míngua de fêmeas porque elas nascem depois deles. O engodo está mais desenvolvido no género Ophrys, em que, além do chamariz olfactivo, há o ludíbrio visual de se imitar o corpo da fêmea — o que leva o macho a tentar copular com a flor.

2.º Mitigar o castigo

Desiludido com o embuste, o insecto só bate uma vez à porta de cada flor. E aqui reside o maior perigo: o de o insecto aprender. O engenho é essencial aos que vivem da trapaça. Espertas, as orquídeas fabricam vários modelos, variando odores, cores e cabeleiras do que imitam, diminuindo assim a capacidade de o insecto reconhecer, pela experiência, o logro; e dispersam-se no terreno para que um voo longo faça o insecto esquecer o desapontamento e tentar de novo.

Se este ardil falha, a evolução natural leva as flores a inclinarem os estigmas para as anteras — resolvendo parcialmente o problema com a auto-polinização — ou à produção de sementes sem fertilização. Tais plantas tendem a isolar-se, tornando-se mais autónomas e capazes de colonizar regiões de clima severo ou inacessíveis a espécies mais exigentes. Algumas dão flores que nem chegam a abrir: no botão fechado, auto-fertilizam-se em segredo e são mães de convento.

3.º O insecto eficaz

Naturalmente é preciso que o insecto tenha a morfologia adequada, o que significa que, para algumas orquídeas, só uma espécie serve. Pior: como todas as outras plantas, as orquídeas atraem bichos que comem folhas ou partes da flor e que raramente contribuem para a polinização. Para evitar este ataque, as orquídeas envolvem-se em aromas desagradáveis ou fermentam os açucares que oferecem, intoxicando os insectos com álcool. E, para não inventar estratagemas de pouco uso, servem-se destas bebedeiras para assegurar que os insectos bem-vindos, que elas ardilosamente defraudam, permanecem apesar disso na vizinhança da população de orquídeas, aumentando assim as chances de polinização.

4.º O embrulho prudente

O pólen está guardado em mochilas (polinias). O insecto que as transportar levará pólen para muitas flores, mas só se tal peso se segurar firmemente. Para isso, as orquídeas (com excepção das que evoluiram para regimes regulares de auto-polinização) possuem um estigma estéril que segrega uma substância pegajosa e se situa junto às polinias; insecto que ali assome encosta-se inevitavelmente ao visco antes de se roçar nas polinias, que assim se colam sem dificuldade. Minutos depois (e não de imediato, para garantir que o pólen não se deposita na mesma inflorescência), os saquinhos de pólen inclinam-se para alinharem a direcção com a superfície do estigma da próxima flor a visitar.

Uma vez fertilizada, a flor murcha rapidamente; as que não forem tocadas por um polinizador competente arrastam uma existência bastante mais longa (e, supõe-se, mais amarga).

Este vídeo de David Attenborough mostra alguns aspectos do que aqui contámos.

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