A margem esquecida do rio
Uma das mais aguerridas polémicas que se desenrolaram neste plácido blogue teve como pretexto a Bidens pillosa, congénere sul-americana da planta que hoje sobe ao palco. As questões que exaltaram (moderamente) os ânimos foram estas: pode uma planta daninha, causadora em todo o mundo de grandes prejuízos nas colheitas, ser apreciada pela sua beleza? É legítimo o «romantismo floral» servir-se de tão maléfico vegetal para ilustrar a espantosa diversidade de meios que as plantas usam para se disseminarem? A resposta requer alguma capacidade de diferenciação. É possível, por exemplo, reconhecer que alguém foi um grande escritor sem esquecer que foi também um grande patife. Podemos ler e apreciar a prosa de um autor sem querermos ser governados pelas suas ideias. Do mesmo modo, há plantas de que podemos admirar a beleza ou o engenho mas que preferíamos, por muitas e boas razões, não ver por perto. Um bom exemplo é o jacinto-de-água, que é ao mesmo tempo uma terrível praga e uma criação admirável da natureza.
A Bidens tripartita, não comungando da índole expansionista da sua prima americana, tem pouco a ver com esta discussão. De facto, apesar de ocorrer em todo o continente europeu, tem exigências ecológicas particulares (lugares húmidos e algo nitrificados) que fazem dela uma presença esparsa. Em Portugal, por exemplo, só se encontra na metade norte do país, especialmente no noroeste, nas margens de um ou outro rio; e, como tem floração tardia (de Agosto a Outubro), passa ainda mais despercebida. O exemplar das fotos morava junto ao poluído rio Vizela, num pedaço esquecido de margem contíguo ao Parque das Termas.
As fotos mostram cabalmente o aspecto da Bidens tripartita, em particular as suas folhas tripartidas e as longas brácteas que rodeiam a inflorescência. Falta informar, contudo, que esta planta anual atinge uma envergadura considerável: nada menos que um metro de altura.
Errata. A Bidens tripartita, ao contrário do que supúnhamos, é actualmente muito pouco comum em Portugal, parecendo ter sido expulsa dos seus habitats de eleição por uma impostora que muito se assemelha a ela e tem a mesma época de floração. A Bidens frondosa, assim se chama a intrusa, tem origem norte-americana e chegou a Portugal ainda no século XIX. A verdadeira Bidens tripartita, que nunca vimos, tem folhas com pecíolo curto e alado (i.e., dotado de duas membranas laterais).
1 comentário :
Concordo plenamente com esta visão sobre as espécies vegetais. Mesmo, algumas delas, causando danos por se tornarem "invasoras" elas merecem, de igual modo, a minha admiração e entusiasmo. Mais não fazem do que desenvolver estratégias de sobrevivência, uma característica saudável de todas as espécies, animais e vegetais.
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